domingo, 9 de agosto de 2015

Andarilho da montanha

Porque nos incomodamos quando um inseto sobe em nosso corpo? Talvez seja porque enquanto ele estava fora, o nosso corpo se encontrava de certa forma em uma harmonia, equilíbrio com o meio aparente, mas de fato esta é só a ausência de sensação, pois na realidade estamos constantemente interferindo no meio, a diferença é que não nos importamos com isto, mas por quê? Pois essas coisas são comuns para nosso ser, ele acha que entende como ela funciona, acha que sabe o que ela lhe proporciona, assim deixa de pensar naquilo. Mas quando algo diferente aparece, ela se incomoda imediatamente, mesmo sendo algo muito pequeno como uma formiga, por exemplo, então ela quer que aquilo não seja parte do meio ou apenas passe ou fique um pouco naquele meio, ela imediatamente tenta retirá-lo, assim possivelmente com esta ação a formiga ou será lançada longe ou será ferida ou será morta. Isto de fato vale a pena? Por que não tentamos algo mais simples, aonde tanto você como a formiga cheguem à melhor solução?
Assim como uma avalanche pode matar um homem, este pode matar um inseto. Na montanha acontece à mesma coisa, ela não é apenas um amontoado de rochas, a montanha é composta também por algum solo, grama, árvores, água, neve, e outros seres, e ela parece manter de forma harmoniosa, parece estar em equilíbrio com todo o meio, mas o que acontece quando ocorre uma interferência externa? Vemos que nas bases pouco se muda, pois esta está próxima da horizontalidade, fazendo com que sua forma seja mais distribuída e assim para atingir esta região, deve-se desprender de uma maior quantidade de energia para poder afetar a todos que estão sustentados por esta base e não apenas ela em si, a montanha também não é só a aparência, ele vai muito além da base, podendo ser constituída de magma em seu centro, então afetar a montanha inteira de uma vez é muito mais complicado. Conforme vamos subindo, vemos que fica cada vez mais fácil de alterar o meio, de desestabilizá-lo, pois entramos não como um ser estático, mas como dinâmicos. Aqueles que buscam uma diferença possuem uma curiosidade, e não se querem deixar levar apenas pela sua dinâmica não compreendida, mas procura entendê-la cada vez mais para que possa ter uma melhor conexão consigo mesma para poder assim não apenas ser levada pelo movimento, mas aprender a direcioná-lo também, sabendo escolher os caminhos apresentados pelos diversos destinos possíveis de nossa vida. Assim o andarilho da montanha sobe, mas com cuidado, pois sabe que está entrando em um meio facilmente alterável, anda em terras poucos conhecidas, a estabilidade deste meio é muito frágil, mas mesmo sabendo dos perigos, dos sofrimentos que podem vir, ele não deixa de andar, caminhar, pois seu objetivo é o topo da montanha, chegar a seus limites e não ver o fim e sim o infinito, então anda com sabedoria, move sabendo que vai alterar, mas com calma e muita reflexão, pois cada ação sua modificará o meio e vai depender dele se esta modificação que ele criar será demasiadamente forte ou não nele mesmo, já que o meio se transforma a cada passo seu, logo se ele caminha de forma a se entregar ao meio sem procurar entender ou sentir, facilmente irá provocar um reação na montanha no qual ela poderá derrubá-lo, levando novamente a níveis inferiores, poderá também ser tão forte que você poderá voltar ao início da montanha, talvez pouco afetado, talvez muito machucado ou por fim pode levá-lo a morte. Então sobe-se com paciência, e cada vez mais que se aproxima do topo seu conhecimento sobe junto, mas nunca confie a ponto de dar como certo, por mais que o andarilho passe pelos seus obstáculos na montanha com extrema proeza, não quer dizer que ele já esteja no topo da montanha, então ainda há por vir muitos desafios no seu caminho. E assim o andarilho vai, sobe, sem olhar muito para trás, mas quando olha nunca se arrepende do caminho que trilhou e está trilhando, e conforme a subida ocorre, ele levemente vai derrubando alguns sedimentos que se desprenderam da montanha e estes vão caindo lentamente, junto com todo o resto que ele altera, assim deixando a base da montanha cada vez maior, aos poucos, sem uma mudança radical, senão como dito antes, não só a montanha vai ruir bastante, mas você junto. Então conforme ele sobe, ele altera a região aonde  passou e vai assim fortalecendo a base, vai diminuindo a altura da montanha. Agora o andarilho se encontra no final, o ar está rarefeito, a neve está por todo lado, o corpo está cansado, qualquer passo errado pode ser o último, a mudança de sensações é gigantesca, ele percebe agora como era simples embaixo, como era fácil, e agora enfrenta o seu verdadeiro desafio e o último, a mudança. Ele revê todo seu passado, relembra de todas as coisas, sensações, então ele começa a se prender ao que foi, pois lá parece mais fácil do que estar próximo ao topo da montanha. Mas ao olhar para cima, ele tem um vislumbre do topo, quando olha e observa atentamente percebe que aquele símbolo representa muito mais do que ele é agora, assim como todo o percurso, ele pode ser mais que aquilo, ele pode estar mais alto, mais próximo de seu objetivo, ele não precisa vislumbrar, ele precisa sentir de fato, não ver e sentir a ilusão da própria mente, precisa estar lá, ser aquilo, ele entende agora por que busca seu objetivo. Então continua, e ai ocorre à maravilha da mudança, quando o andarilho chega ao topo da montanha, nada mais importa em relação aquilo, ele chegou ao topo, consegue respirar novamente, sente a vida, perde os medos, não sofre mais, pois está alegre, atingiu seu objetivo, ele é o seu objetivo. Agora do topo ele pode ver tudo, o mundo parece outro, parece novo, mas na verdade é o mesmo, a diferença é que ele proporcionou a si mesmo aquela visão, aquela sensação, aquele ser, ele mesmo ampliou o seu próprio ser. Agora ele pode retornar para a base da montanha, ele não tem mais o que buscar naquele pico, a montanha deixou de ser algo grande para ele, agora ela é uma planície. O andarilho se vê na terra, reconhece seus limites, observa em volta e continua novamente neste mundo no qual só ele pertence, buscando agora novas montanhas para subir, novos desafios, novos caminhos, a ponto de poder compreender tudo que existe em seu mundo, até aquilo que não pode ser visto e apenas sentido.



Então assim como para a montanha, como para a formiga, seremos assim para nós mesmos e para os outros, não adianta querer correr, atingir certos pontos sem entender por que se está lá, o que vai fazer lá, qual o sentido do local. Ficaremos perdidos e a mercê do meio, frágil a ele, assim qualquer coisa que interferir ou alterar poderá ser muito forte para o ser que se quer atingir, no caso você mesmo ou o outro, quando fazemos para nós mesmos, vemos o mundo, somos o mundo, então parece mais fácil de interagir, mas ele é tão desconhecido como o mundo do outro, não podemos por luz em tudo de uma vez, temos que verificar cada canto e aos poucos espalhar luz por toda parte, assim o mesmo ocorre quando interferimos no mundo de alguém, não podemos esperar que ele esteja realmente pronto para situação que vamos colocá-lo, não faz sentido esperar além sem compreensão, senão iremos esmagá-los como a formiga. O conhecimento tanto para o próprio ser, como para o outro, tem que ser buscada e passada de forma harmoniosa, sem pressa, com sabedoria. Logo como para o Universo, você é parte do meio, não ele inteiro, você junto com todas as outras coisas formam o todo, então não tem por que querer criar algo, onde tudo já é, não tem por que querer destruir a essência, sendo que ela é ela própria, o que podemos fazer é modificar as estruturas que compõem ela, não em seu nível fundamental, mas organizar as peças, modificar suas estruturas para formar outras, dentro do mesmo sistema fundamental, utilizando a mesma essência, não tem como fugir disto, você é feito disto.